Total 90s - XXXII

Neste mês: um resgate pleno de realismo e liberdade criativa; um salvamento fora de série e em câmara lenta; uma banda que viu o sinal de tudo o que a música queria e um ringue de combate para figuras mitológicas.

Filme: ‘O Resgate do Soldado Ryan’Saving Private Ryan (1998)

Durante a Segunda Guerra Mundial, o capitão John Miller (Tom Hanks) lidera um pelotão de oito homens por detrás das linhas inimigas para encontrar e resgatar o soldado James Ryan (Matt Damon), cujos três irmãos foram mortos em combate. O grupo de soldados, formado também pelo sargento Horvath (Tom Sizemore), os soldados Reiben (Edward Burns), Jackson (Barry Pepper), Mellish (Adam Goldberg), Caparzo (Vin Diesel), o cabo Upham (Jeremy Davies) e o paramédico Wade (Giovanni Ribisi) aventura-se pela França ocupada pelos nazis, encetando uma viagem que servirá para conhecerem a essência da camaradagem e combaterem os seus medos interiores para triunfar sobre um futuro incerto com honra, decência e coragem.

O argumentista Robert Rodat concebeu a ideia para a história do filme em 1994, quando visitou um monumento dedicado aos quatro filhos de Agnes Allison em Port Carbon, na Pensilvânia. Os irmãos foram mortos na Guerra Civil Americana. Rodat decidiu escrever uma história similar, ambientada na Segunda Guerra Mundial. O argumento foi enviado à Paramount Pictures e ao produtor Mark Gordon, que o encaminhou a Tom Hanks. Finalmente, foi entregue a Steven Spielberg, que decidiu realizar o filme. A premissa da obra é ligeiramente baseada no caso real dos irmãos Niland, como relatado nos livros do historiador norte-americano Stephen E. Ambrose. Dois foram mortos e um terceiro dado como falecido; de acordo com a Política do Único Sobrevivente, o quarto seria devolvido da guerra.

As filmagens deste épico demoraram cerca de 14 meses. Foi unanimemente apontado como sendo o filme com as cenas de combate mais realistas de sempre. A atestá-lo a magnífica sequência do desembarque do exército aliado fotografada por Janusz Kaminski. O realismo da batalha nas praias da Normandia motivou o elogio dos veteranos da Segunda Guerra, tornando-o o filme sobre a Segunda Guerra Mundial mais credível desde ‘Tora! Tora! Tora!’ (1970). O filme é essencialmente uma história de amizade, humanitarismo e heroísmo no campo de batalha, factores alicerçados em sólidos desempenhos interpretativos dos actores principais, com destaque para Hanks.

Vi ‘O Resgate do Soldado Ryan’ quando estreou nas salas em Portugal e fiquei impressionado, especialmente com a agora considerada por muitos como a cena de guerra mais fiel da história do cinema. A sequência de 24 minutos de desembarque na Normandia pelas tropas norte-americanas tornou-se icónica por ter sido filmada por um operador de câmara que corria ao lado dos actores, instruído para fazer uma panorâmica para qualquer parte do horror que lhe chamasse a atenção. Não deixa de ser irónico que um filme tão elogiado pelo seu esforço de realismo apresente uma falácia na premissa principal do seu argumento. É certo que a referida Política do Único Sobrevivente é real mas a mesma só foi instituída após o final da Segunda Guerra Mundial e apenas é aplicável em tempo de paz. Arriscar a vida de oito homens em pleno conflito para fazer regressar um “mero” paraquedista coloca reticências quanto à sua plausibilidade.

Série: ‘Marés Vivas’ - Baywatch (1989-2001)

‘Marés Vivas’ gira em torno do trabalho de uma equipa de nadadores-salvadores e as suas relações interpessoais, com enredos geralmente centrados em perigos relacionados à praia e outras atividades pertinentes ao estilo de vida da Califórnia. Tudo, desde tremores de terra a ataques de tubarões, assassinos em série e até mesmo bombas nucleares, serviram como sinopse para conflitos no programa. Salvar pessoas de afogamento é uma das situações mais típicas de cada episódio. A série durou de 1989 até 1999 (e de 1999 a 2001 como ‘Baywatch Hawaii’) e ainda gerou o spin-off ‘Baywatch Nights’ (1995-1997) e o filme ‘Baywatch: Marés Vivas’ (2017), uma espécie de remake a tentar parodiar a série original.

Gregory J. Bonann, um dos criadores da série (juntamente com Michael Berk e Douglas Schwartz) trabalhou como nadador-salvador em Los Angeles e desenvolveu um projecto para um possível filme sobre a sua profissão que eventualmente se tornou ‘Marés Vivas’. ‘Baywatch’, no seu nome original e pelo qual se tornou conhecida mesmo por cá, estreou na NBC em 1989, mas foi cancelada após apenas uma temporada devido ao elevado custo da sua produção e por baixa audiência. Sentindo que a série ainda tinha grande potencial, o actor principal David Hasselhoff reavivou-a para first-run syndication (uma espécie de distribuição dos direitos do programa a nível nacional sem afiliação a um único canal) em 1991, investindo o seu próprio dinheiro e, adicionalmente, trabalhando como produtor executivo. A partir daí, o sucesso de ‘Marés Vivas’ foi de tal modo avassalador que a mesma entrou para o Livro dos Recordes do Guiness como a série de maior audiência de todos os tempos quando chegou a atingir em 1996 a marca de 1.1 biliões de espectadores, espalhados por 142 países.

A estrela de ‘Baywatch’ é, como referido anteriormente, David Hasselhoff, da famosa série de TV ‘O Justiceiro’ (‘Knight Rider’, no original), interpretando Mitch Buchannon. Hasselhoff foi o único a actuar em todas as temporadas, seguido por Michael Newman, nadador-salvador também na vida real, que fez 10 das 11 temporadas. Muitos diferentes actores e actrizes participaram ao longo da série mas a maioria aparece apenas em algumas temporadas. A sex symbol dos anos 90, Pamela Anderson, foi definitivamente a maior revelação da série, que também tornou famosos nomes como os de Yasmine Bleeth, Carmen Electra, Erika Eleniak, Donna D'Errico, Nicole Eggert, David Chokachi, Gena Lee Nolin, Jaason Simmons, e Kelly Slater, um surfista profissional, entre muitos outros. As duas últimas temporadas, passadas no Havai revelaram ainda a actual superestrela Jason Momoa, que se estreou à frente das câmaras no seu estado natal.

Conhecedora do sucesso que o programa fazia do outro lado do Atlântico, a RTP comprou os direitos de transmissão de ‘Marés Vivas’ mas acabou por cedê-los à concorrência. O proveito ficaria para a TVI, pois seria sob a alçada da estação de Queluz que a série viveria o seu momento de maior popularidade entre os espectadores portugueses. Ao todo, foram cinco anos, de 1993 a 1998, em que o grupo de nadadores-salvadores de Malibu se tornou companhia fiel de miúdos e graúdos, tornando a série num dos mais memoráveis êxitos da televisão portuguesa nos anos 90. Ficaram famosas as corridas em câmara lenta e os icónicos fatos de banho vermelhos das voluptuosas personagens mas o conteúdo narrativo dos episódios já era fraco na altura e, à distância de mais de 30 anos desde a sua estreia, parece até risível, facto que o filme de 2017 tentou explorar mas que falhou em toda a linha.

Álbum: ‘The Sign’ – Ace of Base (1993)

Os Ace of Base são um grupo pop sueco formado em 1990 pelos três irmãos Jonas "Joker" Berggren, Jenny Berggren e Malin "Linn" Berggren, juntamente com Ulf "Buddha" Ekberg. Inicialmente chamado Tech Noir, o quarteto originário de Gotemburgo começou por ter algum sucesso na Dinamarca, primeiro com o single ‘Wheel of Fortune’ e depois com ‘All That She Wants’, cujo êxito se notou um pouco por toda a Europa. Apelidados pela imprensa musical como os “novos ABBA”, os Ace of Base lançaram o primeiro álbum em 1992 intitulado ‘Happy Nation’ mas o crescente sucesso da banda levou a que este fosse reeditado no ano seguinte, com mais faixas e um lançamento mais abrangente, sob o nome ‘The Sign’, designação homónima de um dos seus singles mais conhecidos.

‘The Sign’ inclui várias canções de ‘Happy Nation’ e os novos singles ‘Don't Turn Around’, ‘The Sign’ e ‘Living in Danger’, para além de versões revistas de ‘Voulez-Vous Danser’ e ‘Waiting for Magic’. Distribuído pela Arista Records, uma subsidiária da Sony Music, o álbum de dance-pop do quarteto sueco foi um sucesso à escala mundial, destacando-se nos Estados Unidos, onde alcançou a impressionante certificação de disco de platina por nove vezes e foi o álbum mais vendido de 1994. Os Ace of Base continuaram a lançar singles de sucesso ao longo da década de 1990, com canções como ‘Beautiful Life’, ‘Lucky Love’, ‘Cruel Summer’ (versão de um original das britânicas Bananarama), e ‘Life Is a Flower’. Contabilizando os primeiros quatro álbuns de estúdio editados, a banda vendeu um total de 30 milhões de cópias por todo o mundo, tornando-os o terceiro grupo sueco de maior sucesso de todos os tempos, atrás dos ABBA e dos Roxette.

Actualmente, os Ace of Base resumem-se a Joker Berggren e Buddha Ekberg. Linn Berggren começou por se afastar das luzes da ribalta gradualmente após um incidente grave com uma “fã” obcecada e por volta de 1997 a sua contribuição já era praticamente nula. A sua irmã Jenny também abandonaria a banda em 2010, altura em que foram apresentadas duas novas vocalistas: Clara Hagman e Julia Williamson. A nova formação dos Ace of Base gravaria apenas um álbum nesse mesmo ano, intitulado ‘The Golden Ratio’, o quinto de originais. Face ao fracasso comercial do último, Hagman e Williamson deixaram a banda entregue à dupla masculina fundadora e, com a excepção do lançamento de colectâneas e de alguns remixes de canções antigas, os Ace of Base permanecem praticamente em inactividade.

Aproveitando o sucesso comercial que o subgénero musical conhecido como Eurodance ou Europop teve nas tabelas do “Velho Continente”, os Ace of Base lançaram-se e tiveram aceitação quase imediata. Já conhecia alguns dos singles mais rodados nas rádios quando uma ex-namorada me ofereceu o álbum ‘The Sign’ gravado em cassete. Foi num Verão que isso aconteceu e, apesar de não ter continuado a seguir a carreira do grupo sueco, gosto do álbum e ouvi-lo faz-me recorrentemente relembrar os tempos veranis do início da adolescência.

Videojogo: ‘Mutant Fighter’ (1991)

O rei está morto e um torneio de combate vai realizar-se para determinar um novo governante. O jogador enfrenta doze oponentes sequencialmente em um combate um-a-um e, se derrotar todos eles, será coroado governante do reino. Desenvolvido pela nipónica Data East para as máquinas arcade em 1991, como sequela do jogo ‘Hippodrome’ (1989), ‘Mutant Fighter’ começou por estrear exclusivamente no Japão (com o nome ‘Death Brade’) mas o seu sucesso fê-lo chegar aos salões de jogos por todo o mundo.

A lista de ‘Mutant Fighter’ inclui oito personagens jogáveis ​​- três personagens humanos e cinco monstros mitológicos; os personagens humanos são: Fighter, Amazoness e Hercules. Os monstros jogáveis ​​são Werewolf, Golem, Minotaur, Dragon e Beast. A versão SNES, lançada em 1993, tem cinco personagens jogáveis, omitindo o “Lobisomem”, Golem e “Dragão”. Personagens não-jogáveis ​​enfrentados como oponentes incluem Hydra, Doppleganger, o demónio Pazuzu e Archmage. Todas personagens têm diferentes estatísticas de poder, velocidade e defesa, com a maior parte dos seus movimentos a fazerem lembrar combates de luta livre.

‘Mutant Fighter’ apresenta o modo de um jogador contra o computador ou um modo cooperativo para dois jogadores, onde os jogadores competem contra dois oponentes de inteligência artificial simultaneamente. O jogador pode escolher quais oponentes enfrentará nos primeiros três combates, sem os personagens não-jogáveis; após essas três partidas, os adversários são escolhidos pelo computador. Ao atingir (ou ser atingido) pelo seu oponente, os personagens acumulam Energia, que pode ser usada para ataques especiais (Super Throw). Cada personagem tem movimentos especiais únicos. Além do movimento único de cada personagem, existem 19 ataques diferentes que podem ser alcançados por meio de diferentes combos.

No início da década de 90 do século passado, as máquinas arcade ainda gozavam de elevada popularidade junto dos fãs de videojogos, numa altura em que a qualidade técnica dos jogos destes sistemas superava largamente os das consolas domésticas. Entre o género de videojogos mais procurados estavam os de luta, ainda antes das franquias ‘Street Fighter’ e ‘Mortal Kombat’ surgirem em força. A única vez que vi e joguei ‘Mutant Fighter’ numa máquina arcade foi durante o período das “férias grandes” nas Festas de Loures, realizadas anualmente no final de Julho. Na área de jogos, a máquina de ‘Mutant Fighter’ chamou a atenção a mim e aos meus amigos, especialmente a um deles, que se especializou a jogar com o “Minotauro” e que “trincava” os adversários em poucos segundos.